A Privacidade em Cripto é Humanitária
Se você vive sob o autoritarismo, a privacidade em cripto é a diferença entre a vida e a morte.
Prezada Nação Bankless,
Cripto possui significados diferentes para as pessoas.
Isso depende de onde você vive.
Se você vive nos EUA, no Reino Unido ou em Singapura, pode significar uma maneira divertida de especular sh*tcoins.
Mas se você vive na Rússia, na Nigéria ou no Afeganistão, as criptos podem significar um meio de sobrevivência.
Governos autoritários não pensam duas vezes antes de virar o sistema financeiro contra seus próprios cidadãos.
Trata-se, literalmente, de uma questão de vida ou morte.
Hoje, Neeraj Agrawal da Coin Center defende a razão da privacidade em cripto ser não apenas um direito, mas também uma necessidade humanitária.
Confira a importância desse “privilégio” financeiro.
Nação Bankless
Privacidade Cripto é Humanitária
Autor: Neeraj Agrawal
Intermediários financeiros podem se tornar ferramentas de opressão. A privacidade das criptomoedas pode ser a única saída.
Não é segredo que o autoritarismo digital está crescendo globalmente. Nossa internet está estruturada ao redor de pontos de estrangulamento e do armazenamento de informações centralizadas.
As atividades mais importantes na internet passam por servidores de empresas como Facebook, Google ou Amazon. A atividade financeira, de forma parecida, passou a ocorrer em redes de intermediários como o PayPal e o sistema bancário. Em última instância, essas empresas podem ser controladas pelo Estado.
Uma proposta tentadora para um líder à procura do controle de sua população.
Essa é a razão pela qual, o recente movimento do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos para sancionar a ferramenta de privacidade de criptomoedas Tornado Cash, pode ser ainda mais preocupante.
Não vamos aqui sequer adentrar nos argumentos que, o Coin Center está contestando judicialmente a sanção mencionada, questionando se um contrato inteligente autônomo é uma entidade passível de sanções. Tal sanção deu origem a um debate ainda mais amplo acerca da privacidade financeira em geral.
Um cético às criptomoedas poderia talvez questionar a razão de uma ferramenta como a Tornado Cash ser necessária. Este é sem dúvidas o mais novo exemplar do “por que você precisa de privacidade se não tem nada a esconder”? É um fato que a maioria das atividades com criptomoedas acontece em blockchains públicas que podem ser rastreadas com facilidade.
Também é um fato que a maioria das atividades que ocorrem nessas blockchains não são ilícitas.
Então, o cético pode dizer que uma pessoa que não quer que sua atividade financeira seja pública deveria simplesmente utilizar um intermediário tradicional que não divulgue suas informações. Enquanto, por um lado, isso eliminaria o risco de uma análise efetuada na blockchain, por outro, seria como se atirar contra uma serra elétrica, no caso do intermediário.
Talvez tal ideia seja boba para aqueles como nós que vivem em uma democracia num Estado de Direito. Porém, o Estado controla o sistema financeiro e nem todos os Estados prezam pela liberdade de expressão e de associação.
Intermediários Utilizados como Armas
Quando protestos contra uma eleição fraudulenta irromperam na Bielorrússia, o governo apoiado por Putin se mobilizou rapidamente para reprimi-las. Um elemento particular dessa repressão foi a punição financeira. Os protestantes receberam multas severas. Empregadores foram pressionados acerca da dissidência de seus funcionários, o que significa que manifestantes perderam seus empregos.
A organização sem fins lucrativos BYSOL começou a ajudar protestantes com apoio financeiro.
A organização se estabeleceu na Bélgica porque, como o protesto foi considerado ilegal, eles estavam, tecnicamente, financiando uma atividade ilegal. Tal uso conveniente da designação criminal é algo observado com frequência. Agora os bancos deles, sem escolha senão se manter conforme a lei, confiscariam os fundos e congelariam as contas dos dissidentes. Não era possível confiar no intermediário.
Mas como fazer com que o dinheiro chegue às mãos dos protestantes? Todas as transferências eletrônicas estavam sendo monitoradas em nome da prevenção de atividade ilegal, e dinheiros em espécie estavam sendo confiscados na fronteira.
A organização recorreu ao Bitcoin. Manifestantes puderam receber os fundos em suas carteiras pessoais, e então fazer pequenas trocas com os habitantes locais para se esconderem do radar do aparato de vigilância financeira.
A utilização dos intermediários como armas, com a lei, tornou-se uma tática. Na Rússia, a oposição política a Putin foi taxada como um grupo extremista, de forma que a prática de doar à organização foi proibida pelos intermediários financeiros seguindo as leis anti-terroristas.
Em Myanmar (ou Birmânia), a Junta passou a implementar rígidas regras de Know Your Costumer (“Conheça seu Cliente”), forçando todos os usuários do sistema bancário digital a se identificarem de forma mais completa para os seus provedores. Tais informações foram combinadas com uma repressão da disponibilidade de dinheiro físico. Desta forma, toda atividade econômica foi forçada a se dar dentro de um sistema bem vigiado, caracterizado pelo congelamento agressivo e aparentemente aleatório de contas bancárias, o que pode ser feito com poucos recursos por parte do governo, na tentativa de conter fluxos de dinheiro para os que lutam pela resistência.
Este problema já ocorreu no Canadá, e pode ocorrer até nos Estados Unidos (ou mesmo no Brasil), o que é talvez impensável para alguns.
A recente anulação do caso Roe V. Wade colocou em risco o acesso ao aborto. Se fornecer serviços financeiros para financiar um procedimento abortivo se tornar ilegal, não é difícil imaginar provedores de pagamento fazendo seus negócios quebrando aquela lei. Ou, se não congelar totalmente a atividade, fornecer evidência para os polícias, da ocorrência do crime.
Vários sites de pílulas abortivas utilizam serviços como PayPal e Stripe para processar pagamentos.
É uma área em desenvolvimento, mas se o PayPal precisar cortá-los, criptomoedas continuarão a funcionar.
As cripto precisam estar à frente dos autoritários
Se o autoritarismo está crescendo e a confiança nos intermediários está diminuindo, segue que as pessoas que necessitam fazer transações impalatáveis ao Estado passarão a utilizar mais dinheiro em espécie e, talvez, mais criptomoedas. Dinheiro em espécie é ótimo, mas limitado a transações presenciais.
Para a era digital, é necessário dinheiro digital, e as criptomoedas são a nossa melhor aposta nesse sentido.
Em casos como os da Bielorrússia, Rússia, Nigéria, Afeganistão, China e muitos outros países, criptomoedas são a corda de salvação para a dissidência e sobrevivência. No entanto, a triste verdade é que essa tecnologia tem sido útil apesar de suas próprias limitações de privacidade.
Enquanto blockchains que podem ser publicamente lidas são uma ferramenta excelente para as polícias rastrearem atividades genuinamente nocivas, elas também são igualmente úteis para um regime autoritário que esteja tentando rastrear o fluxo de doações a ativistas.
Existe pouco conhecimento acerca das capacidades de vigilância às blockchains da maior parte dos países, mas podemos considerar que censores da internet sofisticados como a China e a Rússia estão rapidamente desenvolvendo táticas nesta área. A China é particularmente conhecida por exportar ferramentas de autoritarismo tecnológico.
Não é difícil de imaginar as autoridades na Bielorrússia ou em Myanmar interessando-se por ferramentas capazes de tapar o rombo feito pelas criptomoedas em suas redes de vigilância.
Deveríamos encorajar ferramentas de privacidade, como o Tornado Cash, que poderiam ajudar o povo quando o aparato estatal está totalmente voltado contra eles.
O sistema financeiro intermediário é um alvo fácil de vigilância e de controle. Com as ferramentas corretas, criptomoedas podem ser um modo de vigilância desse poder e uma válvula de escape para pessoas desesperadas.
Mão na Massa
📖 Leia o guia para privacidade no cripto por William Peaster (em inglês)
📺 Assista The Death of Crypto Privacy? por Jake Chervinsky (em inglês)
Biografia do Autor
Neeraj Agrawal é Diretor de Comunicações do Coin Center, um grupo de reflexão sobre políticas envolvendo criptomoedas. É possível seguí-lo no Twitter aqui.
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Post Original: Crypto Privacy is Humanitarian
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